quarta-feira, 18 de março de 2009

Bom Dia!

Entrevista: Mães solteiras
Socióloga norte-americana discute a opção de mulheres que, mesmo sem companheiro, decidiram se tornar mães. A entrevista foi concedida em 2006 à Crescer
Malu Echeverria

"Ser mãe solteira é para mim? Nove sessões para ajudar você a decidir." O anúncio de jornal local voltado para "mulheres cujo relógio biológico está batendo", há mais de dez anos, chamou a atenção da socióloga Rosanna Hertz, na época professora da Universidade Wellesley, Massachusetts. A inquietação se transformou no livro Single by Chance, Mothers by Choice (algo como "Solteiras por Acaso, Mães por Opção"), lançado nos EUA em 2006 e ainda sem tradução no Brasil. Para estudar a criação desse novo modelo familiar composto por mãe e filho(s), um fenômeno crescente por lá, Hertz entrevistou 65 mães solteiras de todos os tipos, de médicas a secretárias. A maneira como se tornaram mães também varia. Entre elas, há as que engravidaram naturalmente, outras que adotaram, as que se submeteram à fertilização assistida com doadores conhecidos ou anônimos e até as que compraram sêmen pela Internet. Todas realizaram um sonho comum – a maternidade – de um jeito incomum – sozinhas –, que está ganhando cada vez mais adeptos nos EUA. Quem são essas mulheres? Por que reverteram a tradicional seqüência amor, casamento e filhos? O papel do pai na família está com os dias contados? Essas e outras perguntas, Hertz responde a seguir. Por que mulheres independentes querem ser mães, uma experiência que vai contra o estilo de vida autônomo da maioria delas? As mulheres que entrevistei, em geral, se tornaram independentes por volta dos 20 anos, eram graduadas e estavam no mercado de trabalho. Muitas já com casa própria. Nunca imaginaram que não se casariam. Estavam felizes com a vida que levavam, mas sentiam que o relógio biológico estava batendo. Lá no fundo, algo as incomodava – e era a maternidade. É possível que tenham sido influenciadas pela idéia social de que todas as mulheres devem ser mães. Ser mãe solteira, então, não é a primeira opção?Para a maioria, não. Elas crescem acreditando que se tornarão mães do jeito convencional. Mesmo depois do parto ou da adoção, ainda esperam encontrar um parceiro que ame o bebê. Imaginam, então, que estão apenas adiantando uma etapa do processo. A decisão não é feita da noite para o dia, mas, nos últimos anos, as mulheres não estão deixando a escolha para o último minuto. Algumas das que entrevistei decidiram por volta dos 32 anos. Você diz que, nos EUA, é mais fácil ser mãe solteira por inseminação do que por adoção. Por quê? A maioria das mulheres que entrevistei preferiu buscar clínicas de reprodução assistida, mas qualquer uma delas poderia ter comprado esperma pela Internet. Imagino que nas clínicas todas sejam tratadas igualmente, casadas ou não. Em resumo, ao decidirem pela inseminação artificial, elas não são submetidas a qualquer tipo de vistoria. Já a adoção envolve leis governamentais, que determinam que os interessados sejam interrogados para saber se eles se enquadram no modelo "ideal". Pessoas solteiras, incluindo homens, têm mais trabalho para adotar. A tendência é de as crianças serem entregues a casais. Apesar da burocracia, às vezes, é mais fácil recorrer à adoção internacional. Quais são as vantagens e as desvantagens em se tornar mãe solteira por inseminação artificial? Quando os doadores são anônimos, há vantagens na lei. Isso porque, nos EUA, esses pais, ao contrário de doadores conhecidos, não têm direitos e deveres em relação ao filho. Assim, as mães não precisam se preocupar com questões legais. Entretanto, essas crianças não têm uma figura que represente o pai, ainda que distante. Além disso, em minha pesquisa, nenhum dos doadores conhecidos demonstrou interesse em reclamar a paternidade. Você não acha injusto uma criança não poder conhecer o próprio pai? Essa é uma questão importante. Nos EUA, a lei protege a identidade dos doadores anônimos . Na Inglaterra, o anonimato expira quando a criança completa 18 anos. A legislação, no momento, está só do lado dos adultos. Na minha opinião, as crianças deveriam ter a oportunidade de saber mais sobre sua origem. Espero que tais leis mudem futuramente. As mães solteiras são acusadas de egoísmo por "privarem" a criança da convivência com o pai? Não se o filho for adotivo ou fruto de um relacionamento. Nesses casos, foram "abandonadas" ou estão fazendo o bem. Algumas são criticadas, entretanto, por minar a família composta por pai, mãe e filho. Para mim, elas estão inventando um novo tipo de família e pretendem torná-la tão estável quanto a tradicional. Até porque a presença do pai não é garantia de que os filhos serão bem criados. O papel do pai estaria ameaçado? Talvez alguns homens possam se sentir receosos ao perceber que essas famílias são bem-sucedidas e, principalmente, que as mães têm parcela nisso. Mas isso não significa que elas estejam tentando destruir a função paterna. Qual o futuro da família? O modelo composto por mãe e filho(s) tornou-se o centro da família americana. Apenas 24% delas estão com ambos os pais. A maioria das crianças, em algum momento, vai morar com apenas um deles. Os números indicam que as mulheres economicamente independentes não precisam de homem ou casamento para ser mães. Hoje, algumas mulheres cujos filhos foram concebidos por inseminação com doador anônimo estão procurando, pela Internet, os irmãos de seus filhos. Há famílias nas quais o lado paterno está sendo criado sem a presença do pai biológico. O fenômeno das mães solteiras de classe média veio para ficar.



Fonte: Revista Crescer